domingo, abril 27, 2014

Falácia do Jogador, Mão Quente e Jogos de Azar

A falácia do jogador refere-se a uma série de “erros” cometidos no jogo de azar. A sua origem é acreditar que as chances de jogo futuro dependeriam do ocorrido no passado. Um exemplo muito simples mostra isto. Se uma pessoa jogou uma moeda e tirou 5 caras, a chance de tirar coroa num próximo lançamento permanece em 50%. Ou seja, os lançamentos realizados não influenciam na aposta do próximo lançamento.

Outro conceito relacionado com esta falácia é o da “mão quente”. Num jogo de basquete, quando um jogador acerta três arremessos seguidos, os espectadores costumam afirmar que ele está com a “mão quente”. Assim, acredita-se que este jogador deveria tentar novamente um arremesso. No entanto, as pesquisas mostraram que a “mão quente” não existe na prática. Isto é coerente com a falácia do jogador, já que os dois conceitos estão inversamente relacionados.

Uma pesquisa conduzida numa bolsa de aposta, com quase 400 mil apostas, tentou verificar o que ocorre na prática com os jogadores. E resultou numa descoberta surpreendente: existe a mão quente. Dois pesquisadores de Londres verificaram o que ocorria com as pessoas que ganharam uma aposta numa rodada. Eles descobriram quando um jogador ganha uma aposta, a chance de ganhar a próxima aposta aumenta. Eis o que informa o gráfico:
O gráfico mostra na linha pontilhada a probabilidade de vencer do jogador que venceu anteriormente. A linha com o triangulo apresenta a chance real da aposta do jogador. É possível perceber que o jogador que vence as apostas anteriores aumentam suas chances de vitória na aposta seguinte. Um dado obtido pelos pesquisadores informa que o jogador que venceu seis apostas possui 76% de chance de vencer a próxima aposta. E o jogador que perdeu seis vezes, terá 23% de chance de vencer a sétima aposta. Os achados da pesquisa provariam que existe a “mão quente”. Isto contradiz a falácia do jogador.

Os pesquisadores, no entanto, acharam uma possível justificativa para o resultado surpreendente. Eles acreditam que os jogadores já sabem da falácia do jogador. Ao ganhar a primeira aposta, os jogadores ficam mais conservadores na sua aposta. Eles passam a escolher apostas com maior probabilidade de vencer. Já os perdedores, sabendo da falácia, resolvem arriscar mais na próxima aposta.

Este é um fato interessante que indica que ao descobrir os vieses, falácias e enganos, o ser humano ajusta seu comportamento.

Leia Mais: Kiersz, Andy. Researchers Tested The 'Gambler's Fallacy' On Real-Life Gamblers And Stumbled Upon An Amazing Realization
Research Digest. Getting to grips with implicit bias.

O artigo original é
XU, Juemin; HARVEY, Nigel. Carry on winning: The gamblers’ fallacy creates hot hand effects in online gambling. Cognition. Volume 131, Issue 2, May 2014, Pages 173–180.

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quarta-feira, abril 09, 2014

Decisão e Taxa de Desconto

Quando estudamos matemática financeira aprendemos que o fator de desconto das decisões cresce exponencialmente com o passar do tempo. Uma consequência disto é que um investimento que traz retorno em um ano terá uma atratividade maior que outro investimento, com os mesmos valores, que tem retornos em dez anos. Neste modelo bastante conhecido, antecipar recebimentos e postergar pagamentos seria a decisão mais racional.

Entretanto, as pesquisas na área comportamental tem mostrado que as pessoas não tomam decisão desta forma. Ao contrário do que aprendemos na matemática financeira, a taxa de desconto não é constante no tempo. Seria, em lugar disto, “quase-hiperbólica”. Se tivermos dois investimentos, com mesma taxa de desconto e mesmo valor presente, a decisão racional seria indiferente. Na vida real, as pessoas tendem a dar um peso maior para o fluxo que ocorre mais cedo. Assim, se você oferecer para um indivíduo $1.000 hoje ou $1.200 em um ano, as pessoas tendem a escolher a primeira opção. Peça aqui a preferência pela recompensa antecipada. Mas se a escolha for $1.000 daqui a dez anos ou $1.200 em onze anos, a preferência será a segunda opção.

Uma conhecida experiência relacionada com o desconto hiperbólico ocorreu com crianças de quatro anos. Elas eram colocadas num recinto com um prato e um doce marshmallow. Prometia as crianças se não tocassem no doce receberiam o doce em dobro em alguns minutos. Este experimento pode ver visto a seguir:

Algumas crianças tiveram muita dificuldade em resistir à tentação; outras, não conseguiram. A dificuldade delas é visível no vídeo. Para as crianças, a taxa de desconto é muito alta; assim, comer dois pedaços mais tarde tinha um desconto muito alto, fazendo valer a pena aproveitar um pedaço imediatamente.

A questão da taxa de desconto está, portanto, relacionada com nossas decisões diárias. A tatuagem é outro caso onde entender a questão do desconto pode ajudar a explicar a propagação. Sendo uma atitude irreversível, a tatuagem deveria ter uma elevada taxa de desconto. Mas as pessoas parecem subestimar a chance dos gostos mudarem no futuro. As pessoas que fazem isto são mais prováveis de optarem pela tatuagem.

Leia mais
Hyperbolic discounting. Wikipedia
Dynamic inconsistency. Wikipedia
MISCHEL, W., SHODA, Y., RODRIGUEZ, M., (1989), Delay of Gratification in Children, Science; May 26, 1989.
DE PAOLA, Maria; SCOPPA, Vincenzo. Procrastination, Academic Sucess and the effectiveness of a Remedial Program. Iza Discussion Paper 8021, março de 2014
Tattos, Options e Cognitives Biases. Stumbling And Mumbling 

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