quinta-feira, março 01, 2007

Efeito Manada

O efeito manada tem sido objeto de estudo das finanças comportamentais. O recente problema na China pode ser uma outra oportunidade para entender e comprovar esse problema. A seguir um texto do Valor Econômico de hoje sobre o assunto.

Investidor deve ter a capacidade de sair da reação em manada
Valor Econômico

Há três dias observamos um mercado global à beira do pânico. Como todos sabem, a origem desse movimento esteve no cenário externo, principalmente nos eventos ocorridos na China e nos EUA. Não cabe aqui discorrer sobre os detalhes de tais eventos, mas reforçar que, para a maioria dos analistas, não há motivos para que se revisem as perspectivas para a economia global e brasileira este ano. Ou seja, o consenso do mercado não vê alteração nos fundamentos, os mesmos que justificaram a alta sustentada observada recentemente nos principais mercados de ativos de risco.

Como se explica, então, o nervosismo e a queda? O que resultou na evaporação de mais de US$ 100 bilhões de riqueza na bolsa chinesa em um dia? Basicamente, o que observamos em momentos como esse - no qual há um evento extremamente raro e inesperado afetando o mercado -, é uma tendência à maioria dos agentes de inferir que a realização do dia 27 de fevereiro tende a continuar. Basta ler nos jornais do dia seguinte às avaliações de analistas e gestores para verificarmos o quanto é concreta essa tendência. Isso nada mais é do que tentar prever o futuro com base no passado, a chamada Representatividade na teoria financeira comportamental ("Behavioral Finance").

Esse fator é acentuado pela ampla divulgação feita pela mídia sobre os estragos sofridos pelo mercado. Afinal, queda semelhante não era registrada há seis anos e meio, ou seja, um verdadeiro ponto fora da curva dada a distribuição de retornos historicamente observada nos mercados acionários. A disseminação de um fato raro, porém amplamente divulgado, recebe a denominação de "Saliência" na teoria financeira comportamental e é o principal combustível para o contágio de outros mercados não diretamente relacionados às notícias negativas originais.

O ingrediente final para alimentar a realização refere-se à necessidade que os agentes têm de agir em conformidade com o grupo onde estão inseridos (se todos estão vendendo, tendemos também a vender). Errar em companhia da maioria é menos estressante. Já conviver com as consequências de um erro em virtude de um posicionamento oposto ao do grupo é um constrangimento que a maioria evita. Esse é o principal combustível do efeito manada e que tende a acentuar o efeito contágio - que no dia 27 espalhou-se rapidamente -, começando na China, onde o Índice Xangai Composite fechou em queda de 8,84%, e encerrou o dia nos EUA, com o Dow Jones caindo 3,29%.

Tomando por base a opinião de seis economistas ouvidos pelo Valor na edição do dia seguinte à grande queda do mercado chinês, havia um claro consenso de que os fundamentos permanecem sólidos e de que provavelmente a normalidade dos mercados seria restabelecida em breve. Um indicador é a robustez dos preços das principais commodities metálicas, fortemente dependentes das perspectivas de crescimento global, tanto durante como após o fatídico pregão do dia 27.

Ora, se de fato a avaliação é esta, justifica-se um posicionamento oposto ao previsto para a maioria dos agentes pela teoria financeira comportamental como forma de obtenção de ganhos extraordinários. Isto é, se há indícios de que um movimento de manada formou-se com base em um fato raro porém de ampla divulgação (Saliência), e esse efeito magnificou a tendência natural que temos a inferir que o passado recente continuará se repetindo (Representatividade), o melhor que um investidor que acredita na solidez do cenário pode fazer é assumir novas e maiores posições em ativos de risco.

Agir de tal forma resultará em enorme desconforto, uma vez que a possibilidade de errar sozinho, ou seja, comprar ativos de risco no momento em que a manada está vendendo, pode criar um possível constrangimento com o qual a maioria dos gestores não está disposto a conviver, ainda que brevemente.

Aguardar até que a conjuntura esteja mais calma para que novas posições em ativos de risco sejam assumidas significa abrir mão de qualquer potencial de alta em prol da proteção da carteira, uma vez que a calma apenas será recobrada quando houver consenso de que o pior passou. Nesse instante, será tarde demais, pois os preços dos ativos já estarão refletindo essa expectativa.

A possibilidade de ganho no mercado sempre esteve nas mãos de quem consegue identificar fatores ainda não percebidos pelos demais agentes. Porém, não basta apenas percebê-los antes que os demais. É preciso traduzir tal percepção em posicionamentos nos ativos certos, na "ponta" certa (comprado ou vendido) antes que os demais também o façam. Esperar até o cenário clarear implica em evitar um risco e seu respectivo potencial de alta.

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