segunda-feira, julho 08, 2019

QI, Expectativa e Escolha

A busca pelos atributos que fazem uma pessoa tomar boas decisões traz uma pesquisa interessante realizada na Finlândia. Quatro pesquisadores, Francesco D'Acunto, Daniel Hoang, Maritta Paloviita e Michael Weber​, aproveitaram os dados disponíveis do país escandinavo para verificar se o quociente de inteligência, o QI, de alguma maneira afeta as decisões realizadas pelas pessoas.

Na Finlândia, os homens que são incorporados às forças armadas são obrigados a fazer o teste de QI. Usando estes resultados, com testes realizados entre 2001 a 2015, os pesquisadores conseguiram obter algumas conclusões importantes. Neste caso, a Finlândia, sendo uma sociedade homogênea, com bom acesso à escola para todas as pessoas e baixa desigualdade social, é um local adequado para este tipo de pesquisa. Em razão destas três características, além do fato da amostra ser composta por homens, o resultado não foi influenciado por classes sociais, formação escolar ou gênero do pesquisado. O foco dos pesquisadores era tentar entender como as pessoas formam suas expectativas e como isto pode ser influenciado por uma habilidade, medida aqui pelo QI.

Uma crítica que se faz ao teste do QI é o Flynn Effect. Em termos mais simples, as pesquisas observaram que com o passar do tempo, a nota do teste tem aumentado de maneira constante. É como se a população estivesse aprendendo a fazer o teste a cada ano transcorrido. A pesquisa fez um tratamento para este problema, para evitar este efeito.

Com o resultado do teste de muitos homens que serviram nas forças armadas da Finlândia, os pesquisadores perguntaram qual a expectativa de comportamento da inflação nos próximos 12 meses, em uma escala que variava de -100 a 100 por cento. Também perguntaram se a situação econômica era favorável para compra de bens de consumo duráveis. Em um país como a Finlândia, a previsão da inflação futura deve estar próxima de zero. Entretanto, muitos responderam com valores fora de um padrão “esperado”.

O interessante é que o erro na previsão estava relacionado com o QI da pessoa. Eis um gráfico que mostra os homens com maiores quociente de inteligência erraram menos a projeção da inflação. Além disto, os pesquisadores perceberam que algumas pessoas fizeram previsões muito acima do padrão usual. Há um viés já comprovado nas pesquisas que as pessoas tendem a “chutar” em torno de múltiplos de 5. Assim, é bastante comum arriscar, na projeção de inflação, valores como 5%, 10%, 15% e assim por diante. Ao relacionarem este viés com o quociente de inteligência, os pesquisadores também encontraram que pessoas com menores QIs cometem este erro.
A pesquisa também olhou se edução e renda tinham efeito no resultado. Mesmo sendo uma sociedade igualitária, ainda assim existem pessoas com melhores rendimentos ou melhor educação que outras. Nenhuma das duas variáveis apresentou um resultado que poderia ajudar a explicar o erro de previsão.

Uma vertente da pesquisa foi verificar o comportamento das pessoas em termos de economia e empréstimo. Novamente, o QI parece indicar que as pessoas mais inteligentes são aquelas que economizam para a aposentadoria e tomam emprestado para financiar sua educação, mas não o seu consumo. Isto corresponderia a um comportamento mais saudável por parte das pessoas.

A pesquisa pode ser lida no site do Bank of Finland, Discussion Paper 2/2019

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quarta-feira, julho 03, 2019

Desonestidade

Como as pessoas reagem quando acham uma carteira de alguém? A reação varia conforme o local e também o conteúdo da carteira explica o comportamento das pessoas. Um estudo, publicado na Science tratou deste assunto. Alain Cohn, Michael André Marechal, David Tannenbaum e Christian Lukas usaram assistentes que “acharam” uma carteira em 355 cidades de 40 países do mundo. E verificaram a honestidade das pessoas. No total foram 17 mil carteiras, a um custo de meio milhão de dólares.

Em cada carteira tinham listas de compras, em língua local, e cartões com o nome da pessoa que perdeu (incluindo o e-mail). Em algumas carteiras, nenhum dinheiro. Em outras, cerca de 13 dólares em moeda local. Os assistentes entregaram as carteiras para funcionários de bancos, hotéis, agências dos correios, museus e delegacias de polícia. Afirmavam que tinham encontrado a carteira e estavam com pressa para entrar em contato com o dono. E deram a responsabilidade para que recebeu a carteira. Nas carteiras sem dinheiro, o índice de devolução foi de 40%. Nas carteiras com dinheiro, a devolução foi de 51%.

Este índice variou conforme o país: na Dinamarca o percentual de devolução foi de 82%, mas nos Estados Unidos foi de 57%.

Além disto, os pesquisadores também aumentaram a quantidade de dinheiro em três países (EUA, RU e Polônia) e uma grande surpresa: o percentual de devolução aumentou, em lugar de diminuir. Pela teoria formulada por Gary Becker deveria ser o oposto, já que o comportamento desonesto é uma especie de análise do custo benefício.

Outro fato interessante: algumas carteiras não tinham dinheiro, mas tinha um chave. A presença da chave também aumentou o índice de devolução.

O gráfico mostra em amarelo o percentual de devolução com a carteira sem dinheiro; de vermelho, com dinheiro. Países escandinavos são honestos; China foi o mais desonesto. O Brasil ficou em 26o lugar; nada mal, para quem tem a fama de ser um país dos desonestos.

Um estudo realizado no Brasil mostrou também que os grupos sociais podem afetar esta honestidade das pessoas. Trata-se da tese de doutorado de Mariana Bonfim.

Fonte: Civic honesty around the globe. Science 20 JUN 2019. DOI: 10.1126/science.aau8712

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