quarta-feira, junho 29, 2022

Cutucadas não resolvem tudo


O comercial acima é da década de setenta. Mostra um índio diante do problema da poluição. A partir deste comercial, Tim Harford chama a atenção para os limites do Nudge, a teoria do empurrão/cutucada de Richard Thaler e Cass Sunstein. Por esta teoria, pequenas mudanças na forma de apresentar uma informação ou uma decisão podem ser relevantes para a solução do problema final. O livro Nudge foi um sucesso e trouxe a criação de equipes comportamentais no governo. Mas existem dois problemas aqui.

Em primeiro lugar, nem sempre o empurrão funciona. Em situações extremas, como na pandemia, há sérios limites para a teoria de Thaler e Sunstein, embora possa ser útil de uma maneira geral

O segundo problema é que há interesses que podem comprometer a ideia. Postamos aqui que Sunstein chegou a criticar o excesso de medo das pessoas em fevereiro de 2020 e não reconheceu seu erro para não perder um cargo na OMS. Os políticos gostam de soluções "simplistas" e fáceis, que podem evitar o compromisso de tentar efetivamente uma solução.

O comercial acima parece colocar nas pessoas a culpa pela poluição, evitando constranger os governos e as empresas que produzem o lixo. É uma forma de mudar de assunto. O mesmo está ocorrendo com a questão climática? Será que exigir que as [algumas] empresas divulguem relatórios sobre o impacto ambiental é suficiente? 

A ciência comportamental é uma ótima maneira de encontrar pequenos ajustes que podem fazer uma diferença substancial no comportamento. Os ajustes ajudam se o comportamento resolver um problema, mas isso não pode ser tomado como garantido. É fácil ter uma visão comportamental perfeitamente sólida e transformá-la em uma política mal feita.

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segunda-feira, junho 27, 2022

Ancoragem

  • Aproveite a promoção: de R$100 por R$60. 


A ancoragem é usar um ponto de referência, que muitas vezes não tem relevância lógica, para a decisão de uma pessoa. É uma mensagem transmitida de forma escondida visando influenciar alguém. Por este motivo, dizemos que a ancoragem é uma mensagem subliminar. Um aspecto importante das pesquisas com ancoragem é que muitas vezes este ponto de referência pode não ter nenhuma relevância lógica para decisão, mas mesmo assim afeta nossas escolhas. 


Vamos explicar este ponto lembrando de uma pesquisa que foi realizada há meio século por dois dos mais conhecidos cientistas da área comportamental, Tversky e Kahneman. Os dois prepararam uma pesquisa onde cada pessoa fazia um sorteio de um número entre 1 e 100. Logo após o sorteio, solicitava que respondesse a uma questão simples: qual a percentagem de países africanos na ONU? Esta é uma pergunta que uma pessoa típica não sabe a resposta precisa e muitas vezes arrisca um palpite. 


Um aspecto importante da pesquisa é que as duas etapas não possuem nenhuma relação. O sorteio de um número não deveria afetar a resposta da segunda pergunta. São perguntas que os cientistas chamam de independentes. Há um aspecto importante na pesquisa realizada pelos autores: o sorteio foi manipulado para sair somente dois números, 10 ou 65 (1). 


O grupo de pessoas que teve um sorteio com um número reduzido, de 10, respondeu, em termos medianos, que a participação dos países africanos na ONU era de 25%. O grupo que tirou no sorteio o número 65 teve uma resposta mediana de 45%, bem acima do primeiro grupo. A surpresa da pesquisa foi o fato de que o sorteio de um número, um evento que envolve “sorte ou azar”, acabou afetando a segunda parte da pesquisa, que não teria, a princípio, nenhuma relação. 


As pessoas que participaram da pesquisa, diante da dificuldade de responder corretamente sobre os países africanos, usaram o número sorteado como ponto de referência, como âncora. A resposta correta, de 20%, não era conhecida dos participantes, mas na ausência do conhecimento, o número sorteado serviu como âncora. A ancoragem é exatamente tomar decisão basedo em referência, que muitas vezes não possuem uma relação racional com minha escolha.

 

***


Outro exemplo bastante citado na literatura mostra este efeito em termos práticos. Para um grupo de respondentes foi solicitada a resposta da seguinte operação:


1 × 2 × 3 × 4 × 5 × 6 × 7 × 8


Para um outro grupo, a pergunta era a seguinte operação:


8 × 7 × 6 × 5 × 4 × 3 × 2 × 1


Observe que a primeira operação é uma multiplicação, que começa do número um e termina no número oito. A segunda operação começa com o número oito e termina no número um. Há uma propriedade da matemática que diz que a ordem não afeta os resultados. Assim, 3x2 é o mesmo que 2x3. Ou seja, o resultado das duas operações é o mesmo. Em termos mais avançados, ambas são o fatorial de 8, somente apresentados de forma diferente. 


Se usarmos a calculadora será possível obter o resultado correto, ou 40.320. Mas a pesquisa solicitava um palpite do respondente. Sendo ambas as operações iguais, espera-se que o resultado seja idêntico para ambos os grupos. 


A surpresa é que as pessoas tendiam a arriscar um número bem abaixo do resultado correto. Mas o mais surpreendente era que o primeiro grupo, cuja operação começava com o número um, arriscou um valor médio de 512, versus 2.250 do palpite do segundo grupo, onde a multiplicação iniciava pelo número oito (2). 


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Um aspecto importante da ancoragem é que parece estar em todo lugar. Uma pesquisa publicada em 2001 usou a ideia da âncora em um julgamento. Em um caso, os juízes escutam o caso e no final o promotor pede ou uma sentença de 36 meses ou uma sentença de 12 meses. Para o primeiro caso, o resultado final foi uma pena de prisão de 8 meses a mais do que o segundo caso. 


Em outro caso, solicitou-se escrever os últimos quatro dígitos do telefone de cada pessoa. Depois, foi perguntado se o número de médicos existente na cidade seria maior ou menor que este número. Já é possível prever que pelo conceito de ancoragem ocorreu uma influência na resposta obtida na pesquisa. 


Este texto começa com a seguinte frase: Aproveite a promoção: de R$100 por R$60. Este é mais um exemplo de âncora. Se um produto custa R$60, o cliente não sabe se isto é bom ou não. Os cem reais do anúncio é a referência. 


Um truque comum usado pelos corretores de imóveis é levar os potenciais clientes em imóveis caros. O cliente provavelmente não irá comprar o imóvel mais caro, mas forma, a partir daí, uma âncora (4). Depois disso, o corretor leva seu cliente para um imóvel mais barato, que ele deseja comercializar. Este truque também é usado pelo vendedor de automóveis ou no menu de um restaurante, que coloca em destaque alguns pratos mais caros, para formar a âncora. 



***

O que explica a ancoragem? Uma possível explicação é a chamada preguiça cognitiva. Quando somos perguntados sobre o número de países africanos na ONU, imaginamos que a resposta não seja relevante para nossa vida e pensamos uma resposta de forma rápida. A âncora ajuda a resolver um problema como este. Se isto for verdadeiro, deveria existir uma relação entre a ancoragem e o teste denominado CRT (5). Este teste foi criado para tentar medir o nível de preguiça cognitiva das pessoas. 


Outra possível explicação é que em situações onde existe incerteza sobre o valor, um grande intervalo na resposta possível, a âncora é usada como um parâmetro inicial. Se não tenho ideia do número de países africanos da ONU, eu começo com a âncora próxima, no caso o número sorteado, e faço ajustes na minha possível resposta. 


Obviamente é preciso estar atento, pois usar uma variável somente para ancorar minha resposta ou decisão pode ser perigoso e conduzir a decisões ruins. A oferta da promoção parece boa, pois estarei comprando um produto por sessenta reais que tem uma âncora de cem reais. Mas talvez esta âncora tenha sido manipulada. 


A ancoragem funciona quando somos ignorantes do que está sendo solicitado. Mas pode ser poderosa em situações práticas. Uma pesquisa com carros usados mostrou a relação com a distância percorrida pelo veículo (6). Quanto mais rodado for o veículo, menor o seu preço de venda. 


O gráfico abaixo mostra esta relação. Parece bem razoável isto. Mas é possível perceber que há um buraco na relação entre as variáveis quando a quantidade rodada aproxima-se do número exato múltiplo de dez mil. 


É como se o automóvel que rodou 9.900 valesse bem mais que aquele que rodou 10.001. Uma possível explicação é a referência. O primeiro dígito parece ter muito mais influência sobre o valor do automóvel. 


Como toda heurística, a ancoragem tem um lado prático, reduzindo nosso tempo para resolver problemas e tomar decisões. De uma forma geral, produz boas respostas em muitas situações, mas pode também ser inadequada em muitas decisões. Inicialmente sabemos que a ancoragem atua mais fortemente em quatro situações possíveis. Primeiro, quando existe um valor saliente, que se destaca dos demais. Segundo, quando temos pouco tempo para tomar uma decisão. Terceiro, quando temos preguiça mental para pensar um pouco mais sobre nossa resposta. Finalmente, quando estamos lidando com valores absolutos (7). 


***

No livro Rápido e Devagar, Kahneman apresenta o seguinte exemplo de ancoragem:

Ao anunciar um preço de promoção, mas limitando a quantidade comprada, a empresa entregou uma referência para os clientes: doze produtos é um número razoável. A média comprada foi de sete unidades. A mesma promoção, sem limite por pessoa, reduziu a quantidade comprada por cliente. A âncora de doze unidades foi poderosa o suficiente para alterar a decisão dos clientes. 


O exemplo mostra que a ancoragem tem uma grande influência nas finanças, seja no mercado de capitais, na avaliação imobiliárias, no preço dos ativos, no leilão ou negociações ambíguas. 


A literatura de finanças tem chamado a atenção para as operações de divisão de ações. Quando uma empresa faz este tipo de operação, uma ação com valor de $10, passa a ter uma correspondência com duas ações de R$5. O acionista não percebe nenhuma mudança na sua carteira. Entretanto, para um investidor, pode criar uma aparência de que a ação está com preço baixo. É uma oportunidade para aproveitar (8). 


Uma pesquisa com corretores imobiliários levou-os a uma casa e solicitou sua avaliação. Para um grupo de corretores foi entregue um preço sugerido de $65.900; para um segundo grupo, o preço sugerido foi de 83.900, ou 18 mil a mais. Novamente a referência fez seus efeitos. O primeiro grupo teve uma avaliação média de $67.811 e o segundo grupo de 75.190 (9)


***

Uma situação típica de ancoragem ocorre com um investidor que comprou a ação no passado. Se os preços caíram após a compra, a referência para o investidor será o preço passado de compra (10). Veja a figura a seguir:


 


Mesmo que tenha existido uma recuperação do mercado, há uma tendência do investidor manter a ação, até que exista uma recuperação do dinheiro investido. Se o investidor tivesse comprado a ação em outro ponto do tempo, haveria mais chance de venda logo após a recuperação do preço (gráfico a seguir).


 


Talvez a ideia da âncora fique mais clara quando lembramos do leilão. O leilão é uma forma de venda de um produto que pode ser usado para venda de obras de arte, arrecadação de fundos de uma paróquia ou venda de produtos apreendidos pelo governo. 


Cada pessoa que participa de um leilão tem uma expectativa sobre o montante que poderia pagar pelo produto. Em muitos leilões, o processo é aberto com o leiloeiro - o responsável por conduzir o processo - anuncia o lance inicial. Este primeiro lance corresponde a uma âncora para os participantes do leilão. 


O primeiro lance não pode ser muito elevado, pois retiraria a concorrência do processo. Mas não pode ter um valor muito baixo, já que isto tornaria o processo mais demorado e poderia indicar, aos participantes, que o bem é pior do que eles pensam. 


  

Uma pesquisa realizada por quatro estudiosos da Universidade de Columbia mostrou que este preço inicial é relevante para o preço acordado entre as partes. De forma específica, estudou-se se o fato da oferta inicial ser um número exato ou for um número arredondado interfere no resultado final. A pesquisa concluiu que se a oferta inicial for um número preciso, do tipo $234, são âncoras mais potentes (11). 


***

Na medida que absorvemos o conceito de ancoragem, começamos a perceber suas implicações práticas e utilidade. O exemplo da caixinha de natal é resultado da experiência do autor e da percepção do conceito. Ao final do ano é bastante comum que um grupo de funcionários passe uma caixinha de Natal. Os moradores de um condomínio, os usuários do serviço ou clientes de um estabelecimento são convidados a participar. Um dos segredos de uma boa caixinha de Natal é o âncora.


No meu condomínio esta é uma prática comum. Os funcionários tinham o bom senso de solicitar a um morador mais bondoso que abrisse a lista da caixinha. O morador seria a âncora, afetando os demais na sua contribuição. Se a âncora fosse uma pessoa menos bondosa, isto afetaria o total arrecadado. 


Sabendo disso, a escolha de quem seria o primeiro a colocar o nome da lista deve ser objeto de cuidado por parte dos funcionários. 


Esta é uma situação similar àquela narrada por McRaney no seu livro Você não é tão esperto quanto pensa (12). A um grupo de voluntários foi perguntado se aceitariam o trabalho em um acampamento duas horas por semana, durante dois anos. A proposta parece que incomodou a este grupo e 100% responderam de forma negativa. Logo a seguir foi feita uma nova proposta: aceitariam ser voluntários uma única vez, por duas horas. Neste caso, metade das pessoas responderam de forma positiva. 


A primeira proposta serviu como uma âncora para a segunda solicitação. Esta segunda solicitação pareceu razoável diante do pedido de ser voluntário semanalmente durante dois anos. 


Para um outro grupo foi proposta a mesma alternativa do primeiro grupo, sem âncora. Em outras palavras, “você aceitaria ser voluntário uma única vez, por duas horas, em um período de dois anos?”. Sem ter um parâmetro, somente 17% responderam sim, um percentual bem inferior aos 50% obtido com a âncora. 


Há outras situações relatadas do uso da ancoragem em decisões cotidianas, inclusive financeiras. A existência de uma referência ajuda a entender a razão pela qual pessoas mais velhas tendem a achar o preço do ingresso do cinema tão caro. Também é a razão por que os restaurantes mostram a fotografia de certos produtos, mas não de outros. 


Entender a ancoragem pode nos dar uma vantagem em negociações. Quando existir uma transação em situação ambígua, use o conceito a seu favor e estabeleça a âncora antes que a outra parte o faça. Viu um produto que agrada, diga logo seu valor mínimo. Esta será a âncora para a negociação posterior. 


***

Em 2018, o bilionário Elon Musk colocou a seguinte mensagem na rede social: “estou considerando fechar o capital da Tesla por $420. Tenho financiamento.” A surpresa foi enorme, pois naquele momento a ação da empresa estava sendo negociada a 300 dólares. Nesta época, alguns analistas consideravam que o valor mais adequado para o preço da ação seria US$200 dólares (13). 


 


Isto provocou um aumento no preço das ações. Posteriormente especulou-se que Musk realmente não tinha capital para comprar as ações que estavam na bolsa de valores da empresa Tesla. Especulou-se também que estava sob efeito do consumo de maconha. As especulações originaram-se de uma pretensa ancoragem no preço sugerido, de 420 dólares. Nos Estados Unidos, quatro e vinte é um sinônimo de consumo de maconha, já que este é o horário usual do recreio em algumas escolas. 


Passados quatro anos, o mesmo empresário anuncia que irá adquirir as ações da empresa Twitter. Várias semanas depois do anúncio, o empresário informa sua proposta de preço de aquisição das ações: US$54,20. 




1 Ao restringir os números sorteados, a análise dos resultados fica mais fácil. O importante é que temos um número baixo, o 10, e um número acima da média, o 65. 

2 Há diversos livros que relatam este exemplo. Vide, por exemplo, Montier, James. Behavioural Investing. Wiley, 2007. O livro de Montier é um pouco desorganizado e até repetitivo. Mas vale a pena consultá-lo. 

3 Englich, T. and Mussweiler, T. (2001) Sentencing under uncertainty: Anchoring effects in the courtroom, Journal of Applied Social Psychology, 31, 1535–1551. Citado pelo mesmo Montier. 

4 Angner, Erik. A Course in Behavioral Economics. Palgrave, 2012. Este é um livro pequeno, mas bem interessante. 

5 Ver Montier, capítulo 7, para uma discussão sobre o assunto.

6 Pesquisa de Lacetera, Pope e Sydnor citada em Ruggeri, Kai. Psychology and Behavioral Economics. Routledge, 2022. 

7 Não há um consenso na literatura sobre os motivos que levam as pessoas a usar a ancoragem. O texto baseou-se em algumas das referências citadas aqui. Sobre a questão dos valores absolutos vide Pompian, Michael. Behavioral Finance and your Potfolio. Wiley, 2021. 

8 Szyszka, Adam. Behavioral Finance and Capital Markets. Palgrave, 2013, p. 193.

9 Northcraft, G. B.; M. A. Neale, 1987, “Experts, amateurs and real estate: An anchoring-and-adjustment perspective on property pricing decisions,” Organizational Behavior and Human Decision Processes 39, 84–97. O número de pesquisas que já comprovaram o papel da âncora é substancial. Neste caso, os corretores poderiam ignorar o preço sugerido, mas o resultado mostra que eles não o fizeram. 

10 Moosa, Imad; Vikash Ramiah - The Financial Consequences of Behavioural Biases (2017, Palgrave Macmillan). 

11 A pesquisa também sugere que âncoras mais precisas tendem a fazer a negociação ser menos flexível. MASON, Malia F; LEE, Alice; WILEY, Elizabeth; AMES, Daniel. Precise offers  are potente anchors: Conciliatory counteroffers and attributions of knowledge in negotiations. Esta pesquisa foi postada aqui em 2013. 

12 McRaney (Você não é tão esperto quanto pensa. O autor baseia-se o exemplo que será apresentado a seguir em MASON, Malia F; LEE, Alice; WILEY, Elizabeth; AMES, Daniel. Precise offers  are potente anchors: Conciliatory counteroffers and attributions of knowledge in negotiations​.

13 Este caso está detalhado de forma mais extensa na postagem do blog Contabilidade Financeira: https://www.contabilidade-financeira.com/2018/08/tesla-twitter-e-divulgacao-de-fato.html 


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terça-feira, junho 21, 2022

Alerta perigoso

Intervenções comportamentais envolvem sugerir gentilmente que as pessoas reconsiderem ou mudem comportamentos indesejáveis específicos. Eles são de baixo custo, fáceis de implementar e ferramenta cada vez mais comum usado pelos formuladores de políticas para incentivar comportamentos socialmente desejáveis.

Exemplos de intervenções comportamentais incluem contar às pessoas como o seu uso de eletricidade se compara aos vizinhos ou enviando mensagens de texto lembrando as pessoas a pagarem multas.

Muitas dessas intervenções são expressamente projetadas para “aproveite a atenção das pessoas”No momento em que eles podem tomar a ação desejada. Infelizmente, atrair a atenção das pessoas pode excluir outras considerações mais importantes e até sair pela culatra com conseqüências individuais e sociais caras. Uma dessas intervenções comportamentais nos pareceu estranha: vários estados dos EUA exibem estatísticas de fatalidade no ano (número de mortes) nos sinais dinâmicos de mensagens nas estradas (DMSs). A esperança é que estes mensagens preocupantes reduzirão as falhas de tráfego, uma das principais causas de morte de crianças de cinco a 29 anos em todo o mundo. Talvez por causa de seu baixo custo e facilidade de implementação, pelo menos 28 estados dos EUA exibiram estatísticas de fatalidade pelo menos uma vez desde 2012. Estimamos que aproximadamente 90 milhões de motoristas foram expostos a essas mensagens.

Como pesquisadores acadêmicos com formação em divulgação de informações e política de transporte, nos unimos para investigar e quantificar os efeitos dessas mensagens. O que encontramos nos assustou.

Ao contrário das expectativas dos formuladores de políticas (e nossas), descobrimos que exibir mensagens de fatalidade aumenta o número de acidentes.

Estudamos o uso dessas mensagens de fatalidade no Texas. O estado fornece um laboratório útil para estudar essas mensagens, pois possui 880 DMSs, 17 milhões de motoristas e, infelizmente, 3.000 mortes relacionadas à estrada por ano. O aspecto mais vantajoso dessa amostra, no entanto, é que, de agosto de 2012 até o final de nossa amostra, em 2017, o Departamento de Transportes do Texas mostrou essas mensagens de fatalidade apenas por uma semana por mês - uma semana antes da reunião mensal da Comissão de Transportes do Texas.

Esse recurso institucional nos permitiu comparar, por exemplo, o número de acidentes que ocorrem em torno de uma DMS durante a semana em que mensagens de fatalidade estão sendo mostradas, em relação a colisões no mesmo segmento da estrada durante as outras três semanas do mesmo mês. Além disso, fomos capazes de controlar a hora do dia, dia da semana, condições climáticas e feriados. Nós descobrimos isso houve dois a três por cento mais acidentes dentro de um a 10 quilômetros de cada DMS durante a semana em que foram mostradas mensagens de fatalidade. Isso sugere que essa intervenção comportamental específica saiu pela culatra no Texas.

(...)

Com base em nossas descobertas, hipotetizamos que essas mensagens de fatalidade causam mais falhas porque deixam os motoristas ansiosos e os distraem. Nossa pesquisa encontrou várias evidências que apoiavam essa hipótese.

Primeiro, descobrimos que quanto maior o número exibido de mortes (uma mensagem plausivelmente mais chocante e perturbadora), maior o aumento de acidentes. Contagens mais altas de fatalidade estão associadas a significativamente mais falhas, enquanto contagens mais baixas de fatalidade estão associadas a menos acidentes.

Mensagens relacionadas e fatais causam o maior aumento de acidentes em janeiro, quando a exibição mostra o total do ano anterior no Texas. Por outro lado, há um número marginalmente menor de acidentes em fevereiro, quando a contagem de fatalidades é redefinida e é a mais baixa.

Segundo, o aumento de acidentes está concentrado em segmentos rodoviários mais complexos, onde o foco na estrada é provavelmente mais importante e o custo de uma distração mais grave. (...)

Nossa pesquisa mostra que exibir mensagens de fatalidade não resulta em direção mais segura e menos acidentes. Além do argumento mais óbvio de que exibir mensagens de fatalidade pode ser contraproducente, nossas descobertas destacam duas questões mais amplas.

Primeiro, embora as intervenções comportamentais devam chamar a atenção, isso pode ser levado longe demais e ter consequências caras. Segundo, é vital avaliar políticas e seus resultados ao longo do tempo, pois mesmo boas intenções podem não necessariamente levar aos resultados desejados.

Fonte: aqui

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segunda-feira, junho 20, 2022

Excesso de Confiança

 

  • Quantos países fazem parte da Fifa? Chute um número aproximado.

  • Eu apostaria entre 100 a 120 países

  • Certeza?

  • Vai por mim. 


O excesso de confiança é uma das características do ser humano. Um teste comum realizado em pesquisas é fazer perguntas como “quantos países fazem parte da Fifa?” ou “qual a população da Islândia?” ou “quantas cachoeiras existem em Foz do Iguaçu?”. São perguntas genéricas; geralmente quando aplicamos, solicitamos que indique um intervalo onde você tem 90% de certeza que sua resposta estará correta. Um questionário com dez questões, espera-se que o respondente acerte nove respostas. 

***

Veja o exemplo do número de países que fazem parte da Fifa. Para ter 90% de certeza que minha resposta é a correta, se eu não conheço o assunto, minha alternativa é informar um intervalo bastante amplo. Talvez entre 10 a 300 países. Parece uma resposta exagerada, mas o objetivo é ter a certeza de 90%. 


Dar um palpite mais conservador significa menos confiança no seu palpite. No caso acima, o número correto é 211. Bem acima do palpite entre 100 a 120 países. Tenho aplicado este teste em diversas turmas minhas. De uma maneira geral, das dez questões, os alunos acertam em torno de 3 a 4 questões. Isto significa que o número esperado, de nove questões certas, não foi alcançado. Mais ainda, os alunos que acertaram os nove intervalos, foram a exceção. 


A melhor forma de acertar o teste é necessário aumentar o intervalo. Se a pergunta é “Qual a população da Islândia?” e não tenho nenhum conhecimento sobre o que é Islândia o meu intervalo deve ser enorme. Talvez entre mil e cem milhões. Se sei que a Islândia é um país da Europa, que já jogou a copa do mundo, talvez possa restringir o intervalo entre cem mil e dez milhões. Sabendo que é um país perto do polo norte, o meu chute pode ser entre dez mil e cinco milhões. 


As pessoas tendem a ser confiantes nos seus palpites. Esta é a regra geral. Uma pergunta que demonstra o excesso de confiança é questionar, a um grande grupo, quem dirige melhor do que a média dos motoristas. O resultado do questionamento é que mais de 60% das pessoas afirmam que sim. Um economista sueco, Ola Svenson, fez uma pesquisa na Suécia e obteve 69% das pessoas dizendo sim. 


Outras pesquisas similares já foram feitas neste sentido. Algumas delas:

  • Foi perguntado a um casal, qual a contribuição individual de cada um para a união e felicidade do par. A soma da percentagem chega a mais de 100%; 

  • Para cada jogador de uma equipe de basquete foi questionada a sua contribuição para o resultado do time. A soma das percentagens também foi superior também a 100%;

  • Para um grande grupo de estudantes em diversos países do mundo: Qual a contribuição - de 0 a 100% - que o seu país deu para a história? O resultado dos Estados Unidos foi de 30%. Os russos responderam 60%; os canadenses 40%; malaicos responderam 49% e os portugueses 38%. A soma das respostas em 35 países foi de 1.156%, média de 33%. 


As pessoas tendem a atribuir o sucesso a seus próprios talentos e habilidades. Muito mais do que seria razoável. Mas quando existe um evento adverso, geralmente é o “azar” ou a “sabotagem”. Em finanças, os analistas de investimento costumam atribuir maior peso ao sucesso e esquecer as recomendações ruins. 

***

O que explica a superconfiança? Há algumas respostas potenciais, como gênero - os homens são mais confiantes que as mulheres - a idade e a educação. Há uma certa controvérsia sobre a idade, mas as pesquisas mostram que geralmente as pessoas que são “especialistas” tendem a ser mais confiantes que os leigos. Os especialistas sabem mais que os leigos e isto se transforma em mais confiança. As características pessoais, bem como a vida passada de cada indivíduo também pode ajudar a entender o excesso de confiança. 


O teste da calibração foi aplicado a diferentes profissões e pessoas e os resultados mostraram que uma profissão em especial se destacou pelo elevado grau de acerto. Em outras palavras, essa profissão conseguiu indicar, com 90% de certeza, um intervalo correto para a respota do teste. Trata-se do meteorologista. Não foi o médico, ou advogado, ou analista de investimento ou contador. O grau de acerto destes últimos estava bem longe do pretendido. Somente o meteorologia cravou intervalos condizentes com o solicitado pelo teste.  


Mas o que faz com que o profissional que lida com o tempo tenha tido um resultado melhor que os demais? No exercício da sua profissão, o meteorologista lida com julgamentos que são repetitivos, que possuem um feedback constante, rápido e sem ambiguidades. “Para o dia de amanhã, a previsão do tempo é de chuva, com 70% de chance”. Este é um exemplo de previsão realizada pelo meteorologista. No dia seguinte basta verificar se chuveu ou não; em 70% dos dias com esta previsão, deve ter tido chuva. Caso contrário, o modelo usado pelo profissional não é adequado e precisa ser melhorado. Imagine agora que isto seja feito diariamente e em uma grande quantidade de locais. Com o passar do tempo e com os ajustes no modelo, o meteorologista começa a entender o que significa 70% de chance. A presença de um feedback constante, rápido e sem ambiguidades é muito importante para melhorar a previsão do tempo. Isto ajuda o profissional a entender melhor. Ser confiante na previsão do tempo não é bom, pois reduz a qualidade do trabalho realizado. 


Agora imagine o médico. Os profissionais da área de saúde gostam de alardear que são mais inteligentes que os outros mortais. Mas quando o médico examina um paciente, mesmo com a ajuda de exames sofisticados, em muitas situações não possui o feedback constante, rápido e sem ambiguidades. Fazendo a previsão de que o paciente deverá ter uma determinada doença, a confirmação do seu palpite poderá acontecer muito tempo depois. E talvez este médico nem tenha acesso a tal confirmação. 


Tome o analista de investimento que recomenda que seu cliente invista seus recursos em uma determinada empresa no mercado de capitais. Este analista dificilmente saberá se o cliente fez a sua recomendação, qual a quantidade de recursos investida e o tempo. O feedback pode ser demorado ou pode não existir. É bem complicado, pois se a ação da empresa subiu, mas caiu em duas semanas, podemos dizer se ele acertou ou errou? Mais ainda, o analista geralmente não pensa em termos de probabilidade - do tipo: “existe 75% de chance da ação subir”. A ausência do feedback constante, rápido e sem ambiguidade faz com que o analista faça algo bastante humano: valorize os seus acertos e atribua seus erros aos fatores externos. 


Geralmente quando pensamos em termos de finanças, não somos tão precisos quanto o meteorologista. Para termos um feeback sem ambiguidade é necessário determinar de forma precisa o que queremos. Ao fazer investimento, ter um retorno de 10% ao final de um ano. Com isto é possível verificar se a decisão foi adequada, sem uma confiança excessiva. 


Quando recebemos uma dica de investimento, é necessário lembrar que a pessoa pode ser excessivamente confiante na sua crença. Ser crítico neste momento pode ajudar a reduzir prejuízos futuros nas decisões. Da mesma forma, quando tomarmos uma decisão financeira importante, ter uma pessoa do lado que seja pessimista, que lembre o lado negativo, também pode ajudar a evitar futuros prejuízos. Entretanto, a realidade mostra que pessoas excessivamente confiantes tendem a afastar os “pessimistas” do seu ciclo de amizades. (Algumas pesquisas já mostraram que os confiantes tendem a ter um futuro melhor dentro da estrutura de uma organização)


É importante destacar que o excesso de confiança pode ter seu aspecto positivo também. Muitos desafios que resolvemos enfrentar são encorajados pelo mesmo comportamento. Os empreendedores, que podem ajudar a sociedade investimento em projetos que poucos acreditam, possuem esta característica. Isto pode ser positivo, pois alguns investimentos estão à espera das pessoas confiantes para arriscarem seus recursos. 


Para Ler sobre o Assunto: A literatura está refleta de análise do excesso de confiança. Mas o livro de Tali Sharot, O viés Otimista, publicado no Brasil pela Rocco, é uma boa referência inicial. Sobre a calibração, O sinal e o Ruído, de Nate Silver, da Intríseca, é um bom livro. 


Foto: Towfiqu barbhuiya

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quarta-feira, junho 15, 2022

Consumo Conspícuo


Como resolver os problemas financeiro decorrente de uma vida desorganizada? As alternativas são várias, mas entender o que está ocorrendo com sua vida pessoal é importante. Dentre as recomendações, você poderia tentar entender o termo "consumo conspícuo". Vamos começar com a definição: 

Consumo conspícuos é o gasto realizado com o propósito de mostrar a riqueza ou nosso status.

É um conceito bem simples. Para o consumidor conspícuo, exibir para alguém ou para um grupo de pessoas passa a ser algo relevante. Você está mostrando que possui um status mais elevado por conta do consumo. É como se seu gasto permitisse um rótulo social. Geralmente desejamos ser rotulados de forma positiva pelo nosso grupo. O consumo pode ou não ser supérfluo, mas de uma maneira geral quando gastamos voltado para o desejo de mostrar nossa riqueza ou status, há uma grande chance de ser algo desnecessário na nossa vida. 

Este termo surgiu há mais de cem anos, com o sociólogo Thorstein Veblen. Para Veblen, uma nova classe social rica destinou uma grande parte de sua riqueza para manifestar seu status social e prestígio. Em termos comportamentais, o consumo conspícuo é próximo do efeito de demonstração ou efeito bandwagon.  Parte do consumo moderno pode ser explicado por este conceito. Comprar uma bolsa de marca, ter um carro potente, usar o último modelo de uma marca de celular e comprar a camisa famosa são exemplos de situações de consumo conspícuo. 

Alguns teóricos consideram que certas atitudes são próximas ao consumo conspícuo, como é o caso da compaixão conspícua. É a prática de doar uma quantia vultuosa de dinheiro para aumentar o prestígio do doador. Outra situação é construir uma casa enorme, desnecessária para a família. 

Um aspecto importante do consumo é a visibilidade. Não faz sentido ter três automóveis na garagem se ninguém sabe do fato. A doação vultuosa precisa ser acompanhada de uma divulgação do fato. A bolsa de marca deve ter bem visível que é uma bolsa de marca. 

O grande problema é que isto incentiva as pessoas sem condições de tomarem emprestado para tentar "competir" no consumo. Pedir dinheiro para o consumo parece ser algo irracional, mas é mais comum do que pensamos. 

Ter consciência do conceito e suas implicações pode ser um primeiro passo para evitar sua ex-provável compra de um produto conspícuo. 

Para ler mais: O verbete da Wikipedia em língua inglesa é bastante amplo e apresenta alguns aspectos que explorei neste texto. A ideia do texto surgiu de um artigo de Merle ven den Akker, que explora o tema sendo uma holandesa, na Austrália. Ela destaca o aspecto cultural do assunto. 

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sexta-feira, junho 10, 2022

Finanças Comportamentais

 

Em 2006 eu criei o blog Finanças Comportamentais. Minha primeira postagem, veja que ironia, era sobre o comportamento de um macaco. Foram mais de 600 postagens, sobre vários temas. De 2006 para cá a área, que também recebe a denominação de Economia Comportamental e Psicologia Econômica, popularizou alguns termos usados e ganhou prestígio na academia. Os periódicos mais tradicionais já aceitam pesquisas na área e a resistência aos experimentos reduziu.

Em 2020, eu tive a oportunidade de ministrar, pela primeira vez, esta disciplina. Naquele momento tive um grande desafio: como transmitir o conhecimento em uma área que não existia uma estrutura claramente delimitada. Uma olhada no verbete de uma enciclopédia ajuda a ter uma visão abrangente. Vejamos como está estruturado o verbete na Wikipedia, com o título de Behavioral economics (1).

Temos dez itens, complementados por mais três, com pessoas notáveis, um “veja também” e as referências usadas. O verbete começa com uma breve conceituação. O item inicial é sobre a história, o que inclui alguns economistas clássicos, entre eles Adam Smith. Há também a lembrança dos laureados com o Nobel: Herbert Simon (1978), Kahneman e Vernon Smith (2002), Shiller (2013) e Thaler (2017). A questão da racionalidade do ser humano é apresentada logo após. Destaque em separado para dois “ramos” da economia comportamental: teoria do prospecto e o empurrão (2). É interessante notar que um subtópico com as críticas ao empurrão consta do verbete, mas não há nada relativo ao prospecto (3). O quinto item do verbete apresenta alguns conceitos da área. Isto inclui contabilidade mental, manada, falácia do jogador e outros. A seguir é detalhado o campo de finanças comportamentais. O sétimo item do verbete trata de aplicações em animais, seguido de aspectos práticos da área. O verbete tem uma seção de críticas e encerra com áreas relacionadas.

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Outra forma de pensar as finanças comportamentais (4) é através dos seus métodos. Talvez isto seja pouco prático para dividir o campo de estudo. Os assuntos seriam então classificados em pesquisas oriundas de laboratórios, questionários e experimentos naturais.

Os experimentos naturais são aqueles que acontecem na vida prática, sem a necessidade da intervenção de um cientista. Um experimento natural famoso na área é a discussão polêmica sobre a existência ou não da “mão quente” no basquete. Alguns acreditam que quando um jogador começa a acertar seus lances, neste dia ele estaria com a mão quente. Algumas pesquisas chegaram à conclusão de que isto é uma lenda, mas há controvérsias.

As pesquisas oriundas de laboratorios é quando a pesquisa tenta reproduzir, de forma simplificada, algo que ocorre no mundo real. Quando Dan Ariely dividiu seus alunos e cobrou um trabalho escrito, com diferentes prazos para entrega, ele estava fazendo um experimento natural (5). O pesquisador descobriu que o prazo de entrega não afeta a qualidade do trabalho.

Os questionários são usados há tempos na área. Algumas das pesquisas mais conhecidas de Kahneman e Tversky, os dois maiores nomes da área comportamental, usaram este método (6).

Como o método é um meio, é realmente estranho pensar nas finanças comportamentais a partir desta classificação (7).

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Dois conceitos são relevantes em finanças comportamentais: heurística e viés. A heurística é um procedimento mental simples que procura responder questões que são difíceis. O viés é a distorção do julgamento, que irá ocorrer em certas situações, provocando efeitos sobre o julgamento das pessoas.

Quando tratamos das finanças comportamentais é comum olhar para as heurísticas e os vieses. O problema é que existe uma grande quantidade de heurísticas e vieses catalogados. Em alguns casos, há uma confusão sobre onde começa um e onde termina outro. Recentemente algumas das conclusões dos trabalhos pioneiros sobre aversão à perda foram questionadas, mas ainda há discussão sobre isto e talvez não seja capaz de abalar as estruturas da área (8).

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A relação de finanças comportamentais com a biologia evolucionária, a ciência cognitiva, a psicologia, a sociologia e até mesmo a medicina envolve a discussão da racionalidade humana. Esta “ausência” de racionalidade pode ser explorada pelas instituições financeiras, os influenciadores digitais, os líderes políticos, entre outros, com efeitos nas finanças pessoais.

Neste sentido, as finanças comportamentais têm apresentado uma contínua evolução. A biologia trouxe a questão da adaptação, estudada na hipótese dos mercados adaptativos, de Lo (9). A medicina permitiu o estudo do cérebro diante das situações envolvendo a área comportamental. A sociologia permite entender o papel do grupo nas decisões (10). As novas tecnologias podem afetar o comportamento das pessoas (11). Além da replicação das pesquisas anteriores (12).

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Uma consequência natural do sucesso das finanças comportamentais é que algumas das descobertas e avanços estão sendo questionados. Em outros casos, há uma junção entre os conhecimentos tradicionais com os conceitos da área comportamental. De qualquer forma, isto é bastante positivo, já que mostra a relevância da área para o entendimento do ser humano.

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(1) uso aqui a Wikipedia, que é a enciclopédia mais popular e na língua inglesa, onde os verbetes são mais elaborados. Vide https://en.wikipedia.org/wiki/Behavioral_economics

(2) usei o termo em língua portuguesa, apesar de existir resistência neste sentido.

(3) isto naturalmente não significa que inexista críticas à teoria do prospecto. Talvez sejam menos contundentes.

(4) Usarei o termo finanças comportamentais a partir de agora, embora boa parte dos comentários sejam válidos para Economia comportamental, Psicologia Econômica ou outro termo similar.

(5) Recentemente Ariely foi envolvido em polêmica relacionado com uma das suas pesquisas. Esta pesquisa não foi questionada e eu cito aqui.

(6) O método do questionário não é totalmente aceito, embora suas descobertas geralmente sejam confirmadas posteriormente pelos outros métodos.

(7) Embora tenha usado na prática. Quando um aluno indica que deseja fazer um trabalho na área comportamental, gosto de apresentar os três métodos possíveis e perguntar sua preferência. O experimento natural é realmente o mais difícil dos três, pois além da coleta dos dados ser uma tarefa complicada, é necessário pensar em uma situação que se enquadre. O questionário é o mais fácil e a reprodução de uma pesquisa realizada anteriormente, com ou sem variações, termina sendo uma forma fácil de trabalhar na área comportamental.

(8) Fico devendo a citação, uma vez que estou escrevendo este texto de memória.

(9) Veja a tese de doutorado: Souza, P. V. S. D. (2020). Mercados adaptativos, cultura, variáveis econômicas e contábeis.

(10) Vide, por exemplo, Bonfim, M. P., & Silva, C. A. T. (2021). COLLECTIVE DISHONESTY: AN ANALYSIS OF THE GROUP'S INFLUENCE IN THE DISHONESTY BEHAVIOR. Revista de Administração Unimep, 19(5), 194-219. A tese de Bonfim merece ser lembrada. Além disto cito a tese de Ivone Pereira sobre a questão fiscal: Pereira, I. V. (2017). Fatores que influenciam o comportamento desonesto das pessoas na prática da evasão fiscal no Brasil.

(11) Por exemplo, a dissertação de mestrado de Soares, J. M. M. V. (2019). Efeito Tela na tomada de decisão: uma abordagem experimental em contabilidade (Master's thesis, Brasil). E a tese de doutorado de Souza, I. G. D. M. (2018). Uso de mídias sociais para divulgação voluntária: sentimento na UGC do Facebook e geração de valor para empresas de capital aberto.

(12) a replicação de pesquisa é muito desvalorizada na ciência, mas pode ser relevante para solidificar as descobertas. Um exemplo é a famosa pesquisa sobre aversão à perda, reproduzida de diversas formas, em diferentes culturas.