terça-feira, agosto 25, 2009

Passado e Futuro

Palavra do Gestor: Com que precisão os analistas do mercado brasileiro conseguem prever o futuro?
Aquiles Mosca

Imagine dois grupos de estudantes de pós-graduação. O primeiro grupo é informado que um de seus professores irá para a Europa durante um ano para um período sabático. A esse primeiro grupo de estudantes é pedido para que escrevam o que imaginam que o professor fará durante o ano que está por vir. Um segundo grupo de estudantes recebe a informação de que o mesmo professor já fez um ano sabático na Europa e a esses alunos pede-se para que descrevam o que imaginam que o professor fez durante aquele período.

À primeira vista, não esperamos que haja uma diferença grande entre os relatos dos grupos, por se tratar de grupos representativos e realizando praticamente a mesma tarefa. No entanto, as diferenças verificadas nos relatos dos dois grupos foram relevantes. Os relatos de um passado imaginário foram muito mais detalhados e ricos quando comparados às tentativas de descrever o futuro. Estas últimas, sempre vagas e genéricas. Tal estudo, conduzido pela psicóloga canadense Janet Bavelas, e outros experimentos demonstram que temos mais facilidade de imaginar o que alguém fez em oposição ao que alguém fará. Ou seja, há uma nítida assimetria entre nossa habilidade de explicar o passado e nossa capacidade de prever o futuro.

Uma vez que um evento tenha ocorrido, mesmo que seja algo extremamente raro, nós humanos temos facilidade de encontrar uma explicação plausível. Atentados terroristas como o de 11 de setembro de 2001 e grandes catástrofes aéreas são exemplos típicos, cujas sequências de eventos tornam-se bem conhecidas ao logo do tempo a ponto de serem facilmente assimiladas e até mesmo consideradas como previsíveis a posteriori. No entanto, mesmo na véspera, ninguém é capaz de prevê-los ou de evitá-los.

A teoria financeira comportamental denomina essa facilidade de explicar o passado de "viés retrospectivo" (do inglês, hindsight bias). A mídia financeira está repleta de especialistas sempre disponíveis para explicar os movimentos dos mercados no ano, mês ou na semana passada. Peça então para preverem o futuro e a explicação torna-se vaga e genérica, tal como no estudo acima. Qualquer pessoa consegue encaixar o passado em uma sequência de eventos perfeitamente racionais e intuitivos. Agora, prever o futuro é outra história.

Quão preciso é o mercado brasileiro na tentativa de prever o caminho que as principais variáveis econômicas e financeiras vão percorrer no futuro? Semanalmente, o Banco Central publica tais projeções no boletim Focus. Será que este conjunto de analistas consegue antecipar com alguma precisão e antecedência de 12 meses o PIB, a inflação, juros nominais e reais e o câmbio? Uma rápida olhada na diferença entre as previsões feitas 12 meses atrás e os valores efetivamente observados para essas variáveis revelam erros significativos, entre 40% e 12%. Além disso, para duas dessas variáveis, juros nominais e reais, a média das expectativas dos especialistas foi incapaz sequer de prever a direção em que elas iriam se deslocar. Há um ano, previam aumento dessas variáveis, quando na verdade vimos recuo significativo de ambas. A mesma tendência foi observada para os "Top 5", em princípio os mais precisos em suas previsões, ainda que com um desvio menor. [1]

Muitos dirão que nesse período o mundo foi assolado pela crise financeira e que isso torna as previsões menos precisas. No entanto, para outros períodos no qual predominou maior normalidade (como entre 2003 e 2007), ou seja, sem uma crise tão grave, a margem de erro das previsões também revelou-se grande. No frigir dos ovos, o que mexe com o mercado é exatamente o inesperado! Tudo que é previsível e aguardado não altera as cotações. Já está em grande medida embutido nas expectativas das variáveis econômicas e nos preços dos ativos. A oportunidade de ganhos está em antecipar o que os demais ainda não veem, em fazer isso mais rápido e de maneira mais eficiente que os demais e em traduzir isso em posicionamentos nos ativos certos, na "ponta" certa (comprado ou vendido) antes que os demais o façam. Nesse aspecto, o boletim Focus do Banco Central atua mais como uma fotografia do sentimento reinante na economia em determinado momento do que como uma fonte confiável de previsões desses indicadores ou mesmo da tendência que deverão assumir no futuro.

Durante o planejamento de voo da missão Apollo 11 para a lua, a NASA definiu como margem aceitável de erro nas primeiras estimativas e cálculos em 1961 o nível de 1%, que foi então reduzido para 0,5%, 0,2% e, finalmente 0,05% em 1969, ano do famoso primeiro vôo à lua. [2] Se a NASA precisasse contar com a precisão das previsões do boletim Focus, o voo da Apollo 11 provavelmente não teria alcançado a altura de um balão de festa junina...

Valor Econômico


[1] Isto vale uma pesquisa mais científica para testar esta hipótese. O resultado depende do desvio-padrão da amostra. Consequentemente, a afirmação do texto pode não ser verdadeira.
[2] O nível aceitável de erro depende de vários fatores, inclusive do que estamos medindo. Esperar um nível pequeno em ciências humanas é algo difícil exatamente pela complexidade do ser humano. A comparação não é válida.

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segunda-feira, agosto 24, 2009

Links em Finanças Comportamentais

Links

Sempre que posso indico nos links os textos do blog Não Posso Evitar. São texto muito bem produzidos e seu autor preparou uma série interessante sobre experimentos da psicologia. Abaixo três links do blog:

Os problemas e enganos da memoria

Phil Zimbardo e o efeito Lúcifer

A sobrevivência significava, assim, ter pouca informação sobre muita coisa, em vez de muita informação sobre pouca coisa.

quinta-feira, agosto 20, 2009

Honestidade

Centenas de carteiras foram deixadas nas ruas de Edinburgo, cidade da Grã-Bretanha. Destas, 240 foram devolvidas. Mas existe um aspecto interessante. Quando os pesquisadores inseriram fotografias mostrando um bebê sorrindo, um cachorrinho bonitinho, uma família feliz ou um casal de velhos o resultado mudou.
Quando a carteira tinha um bebê era mais provável receber a carteira de volta (88%). O animal de estimação, a família e o casal de velhinhos tiveram retornos de 53%, 48% e 28%, nesta ordem. Uma carteira com um cartão de uma entidade de caridade e uma carteira sem nenhum objeto diferenciado tiveram uma taxa de retorno de 20% e 15%.

Fonte: aqui

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Homem versus mulher

Dois textos discutem a diferença entre o homem e a mulher no mundo dos negócios. Frederick Lim, em Do men and women invest differently? ; Women tend to be more conservative, say experts publicado em 14 de agosto de 2009, no jornal Today, de Cingapura, afirma que a personalidade é diferente e que isto se reflete em como eles investem o dinheiro.

Citando uma funcionária do Prudential, Tricia Tan, o texto afirma que geralmente a mulher é mais conservadora quando comparada ao homem. Para Tan, uma mulher casada foca na proteção da renda da familia e dos dependentes.

Goh, da Providend, lembra que as mulheres tendem um grande volume de dinheiro em depósitos fixos. E o conservadorismo decorre dos fatores da personalidade.
Uma pesquisa em Cingapura constatou que 30% dos homens investem em ativos de maior risco, comparado com 10% das mulheres. Uma possível explicação por esta atração pelo risco refere-se a confiança maior dos homens.

O segundo texto, publicado no blog Stumbling and Mumbling (Gender & decision-making ) é mais abrangente e aponta diversos resultados de pesquisas:

a) as mulheres são mais generosas com estranhos, principalmente quando estão em grupos onde são maioria. Mas grupos só de mulheres são menos generosas que grupos com maioria de mulheres;

b) as mulheres são piores em negociaçaõ que os homens, especialmente quando a situação não é muito clara;

c) as mulheres têm um desempenho pior sob pressão. O exemplo clássico são as mulheres tenistas, que tem mais probabilidade de erros não forçados em momentos cruciais do jogo;

d) os homens são mais confiantes que mulheres. Mas apesar de negociarem mais ações que as mulheres, eles tem uma rentabilidade menor;

e) as mulheres são mais avessas ao risco.

As diferenças são suficientes para que, numa pesquisa na area de investimento, seja necessário verificar o gênero do respondente.

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Elogio

(...) De acordo com os psicológos que trabalham na área, isto é conhecido como "identidade proeminente". Basicamente, é uma forma sofisticada de dizer que você tem mais probabilidade de efetuar mudanças nas pessoas através de elogios que elas são boas, do que lembrando que são ruins. (...)
TRY A PAT ON THE BACK- 10/8/2009 - The Press (Christchurch) - p. 8


Texto que discute o fato dos neo-zelandeses serem pessoas que tomam boas decisões financeiras

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terça-feira, agosto 11, 2009

Efeito Framing e Controladoria

O objetivo desta pesquisa foi verificar o impacto do aprendizado formal de Controladoria na minimização dos vieses cognitivos em decisões gerenciais. Para isso foram delineados cenários experimentais com situações que envolvem alguns conceitos relevantes de Controladoria em que podem existir vieses cognitivos, como: (a) Custo de oportunidade; (b) Sunk Costs; (c) Custo de reposição; e (d) Teoria das restrições. Com o auxílio destes conceitos, busca-se entender o comportamento associado a vieses cognitivos provocados pelo efeito framing. O experimento contou com um grupo de controle, onde não existia a introdução de vieses nas questões às quais os respondentes foram submetidos, e dois grupos experimentais, onde os questionários continham os vieses, sendo a amostra composta por 155 estudantes dos cursos de graduação de Ciências Contábeis e Direito da Universidade Federal
da Bahia. Para a análise do experimento, foi utilizada a Regressão Logística Múltipla. Os resultados encontrados apontaram para a inexistência de contribuições do aprendizado formal de Controladoria na redução da ocorrência dos vieses, bem como os próprios vieses cognitivos não puderam ser observados na maioria dos experimentos.

EFEITO FRAMING EM DECISÕES GERENCIAIS E APRENDIZADO FORMAL DE CONTROLADORIA: UM ESTUDO EXPERIMENTAL NA BAHIA - César Valentim de Oliveira Carvalho Junior (USP), Joseilton Silveira da Rocha (UFBA) e Adriano Leal Bruni (UFBA)

Este é um trabalho que foi apresentado no Congresso USP de Contabilidade. (Você pode estar pensando que já leu esta postagem anteriormente. Mas apesar da enorme semelhança dos resumos, o trabalho é diferente. A amostra é a mesma, as questões também, mas o instrumento estatístico mudou, de regressão linear múltipla para logistíca.)

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segunda-feira, agosto 10, 2009

Obesidade

Economia comportamental tenta encontrar uma estratégia mais efetiva para derrotar a obesidade estudando os padrões de comportamento e testando como as modificações no comportamento podem resultar na perda de peso. Um estudo conduzido pelo American Economic Review encontrou que mostrar as calorias não resultou em perda de peso entre os consumidores de restaurantes de Nova Iorque. Os melhores métodos de perda de peso inclui usar um prato de 25 centímetros, não comer enquanto assiste televisão e comer frutas antes dos lanches. Esse métodos tem um efetividade limitada, mas a economia comportamental está aumentando mais conhecimento numa indústria não científica da dieta.


Andrew Leigh - The Economics of Obesity - Australian Financial Review - 28/7/2009 - AFRNR - 62

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sexta-feira, agosto 07, 2009

Superstição


Pesquisa de psicologia documenta que pessoas são mais propensas a adotarem práticas supersticiosas quando operam em ambientes dominado por incertezas, high stakes e percepção de perda de controle sobre o resultado. Baseado nestas considerações, nós sugerimos que o mercado acionário representa o campo ideal para a superstição e então testamos se o comportamento supersticioso afeta as decisões de investimento. Nossa análise empírica foca em algumas crenças relacionadas com eclipses, fenômenos que são tipicamente interpretados como mau presságio pelo superticiosos, tanto na sociedade asiática quanto ocidental, e nós empregados um conjunto de dados que contem 362 desses eventos no período de 1928-2008. Usando quatro índices do mercado de capitais dos EUA, nos descobrimos uma forte evidência que suporta nossa hipótese de superstição (isto é eclipses) está associado com um retorno abaixo da média das ações, que é consistente com a redução da pressão compradora dos supersticiosos. Segundo, o tamanho do efeito da superstição é estimado para aumentar no tempo em que o mercado é mais incerto e quando o eclipse tem maior cobertura da imprensa e atenção do público. Terceiro, o desempenho negativo do mercado durante o evento é seguido de um efeito reverso de magnitude similar (10 pontos bases por dia) nos dias subseqüentes. Quarto, eclipses são acompanhadas por uma redução no volume de negociação. Quando nós estendemos nossa análise para uma amostra de países asiáticos, nós encontrados resultados análogos. Os padrões que nós encontramos são inconsistentes com a Efficient Market Theory.


Gabriele Lepori via Do superstition and eclipses matter for the stock market? (Marginal Revolution)

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quarta-feira, agosto 05, 2009

Referências

Um aluno pergunta:

Vou fazer o meu TCC com o tema: Finanças Comportamentais e queria saber se o senhor poderia indicar as primeiras referências que deveria consultar.

Resposta:

Se sua leitura está restrita a língua portuguesa indico os seguintes livros:

a) Previsivelmente irracional - Dan Ariely - Difícil de suplantar em termos de linguagem e capacidade de prender o leitor.
b) Finanças Comportamentais - Aquiles Mosca - do cronista do Valor Econômico.
c) Psicologia Econômica - Vera Ferreira - mais "acadêmico" que os anteriores.

Existem outros livros que não possuem o foco de FC, mas que tratam de forma secundária (por exemplo, Risco, minha atual leitura, de Gardner)

Excesso de confiança e Aprendizado formal


O objetivo desta pesquisa foi verificar o impacto do aprendizado formal de Controladoria na minimização do excesso de confiança em decisões gerenciais. Para isso foram delineados cenários experimentais com situações que envolvem alguns conceitos relevantes de Controladoria em que podem existir vieses cognitivos, como: (a) Custo de oportunidade; (b) Sunk Costs; (c) Custo de reposição; e (d) Teoria das restrições. Com o auxílio destes conceitos, busca-se entender o comportamento associado a vieses cognitivos provocados pelo Excesso de Confiança. O experimento contou com um grupo de controle, onde não existia a introdução de vieses nas questões às quais os respondentes foram submetidos, e dois grupos experimentais, onde os questionários continham os vieses, sendo a amostra composta por 155 estudantes dos cursos de graduação de Ciências Contábeis e Direito da Universidade Federal da Bahia. Para a análise do experimento, foi utilizada a Regressão Linear Múltipla. Os resultados encontrados apontaram para a inexistência de contribuições do aprendizado formal de Controladoria na redução da ocorrência do excesso de confiança, tendo o nível de desempenho acadêmico dos respondentes contribuído apenas no grupo de controle.


O APRENDIZADO FORMAL DE CONTROLADORIA MINIMIZA O EXCESSO DE CONFIANÇA EM DECISÕES GERENCIAIS? UM ESTUDO EXPERIMENTAL - César Valentim de Oliveira Carvalho Junior (USP), Joseilton Silveira da Rocha (UFBA) e Adriano Leal Bruni (UFBA)



Trata-se de um artigo apresentado no Congresso USP de 2009. Os autores testaram quatro hipóteses: (a) quanto maior o aprendizado formal, menor a ocorrência do excesso de confiança; (b) quanto maior o nível percebido de conhecimento em controladoria, menor o excesso de confiança; (c) quanto maior o desempenho acadêmico, menor o excesso de confiança; (d) quanto maior o estágio no curso, menor o excesso de confiança. O estudo conclui que apenas desempenho acadêmico minimiza o excesso de confiança.

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Aposta Martingale

Um dos conceitos clássicos da teoria dos jogos é a aposta Martingale. Trata-se de uma estrategia que um jogador pode assumir em que será sempre vencedor. Considere o exemplo clássico do jogo da moeda. Para um jogador com fortuna infinita, a melhor estratégia é sempre dobrar a aposta até vencer. Se um jogador aposta R$10 mil em cara e perde, a estratégia é dobrar a aposta (R$20 mil). Se novamente ele aposta em cara e perde ele irá dobrar a aposta (R$40 mil). Supondo que ele perdeu, dobra a aposta (R$80 mil). Nesta nova aposta ele ganha, finalmente. Qual o resultado obtido pelo apostador? O cálculo seria o seguinte:

Resultado = -10.000 – 20.000 – 40.0000 + 80.000 = R$10.000

Ou seja, num jogo de cara ou coroa a estratégia de dobrar a aposta permite que o jogador consiga um ganho que corresponde ao valor inicial da aposta.

Entretanto, esta estratégia talvez não funcione na prática. A razão pode estar na teoria de finanças comportamentais, mais especificamente no conceito de aversão a perda. Segundo estudo clássico de Kahneman e Tversky de 1979, as pessoas preferem não perder a ganhar. Isto contraria a premissa de que as pessoas são racionais. E que a teoria da utilidade deve ser considerada com precaução na prática.

É bem verdade que outros conceitos considerados posteriormente ao estudo clássico dos autores também ajudam a explicar a falta de racionalidade nas decisões.

Para saber mais sobre o assunto: Ego investing. Financial Express, Índia, 3/8/2009.

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